segunda-feira, 10 de maio de 2010
Elisa Lucas, primeira mulher eleita presidenta do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra. Integra também o Comitê de Saúde da População Negra do Estado de São Paulo e o Comitê de Mortalidade Materna.
20 de abril de 2010
.NCC SMnoAr - Elisa, como surgiu o Conselho da Comunidade Negra e quais são suas ações?
.Elisa - O Conselho de Estadual de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra de São Paulo foi criado em maio de 1984 pelo governador Franco Montoro atendendo ao pedido de um grupo social que sempre lutou contra a discriminação racial e pela inclusão da população negra no Brasil.
Assim, ele nasceu com o objetivo de implementar políticas públicas para a inclusão da população negra e também para a eliminação dessa questão séria que é a discriminação. As políticas públicas são trabalhadas em várias áreas, como na cultura, na saúde, na educação, no emprego, na segurança pública, na assistência e desenvolvimento social e o Conselho é formado por 32 conselheiros, sendo 10 deles da área governamental e 22 pessoas da sociedade civil.
.NCC - Uma das conquistas do Conselho da Comunidade Negra foi a aprovação da lei 10639. Conte-nos como foi sua criação.
.Elisa - Em nossa gestão, a prioridade foi implementar a lei 10639, que obriga o ensino da história da África e do Afro-brasileiro. A lei foi criada em 9 de janeiro de 2003 e nós começamos uma grande batalha, porque foi um ganho para o movimento negro conseguir a criação da lei. Mas, por outro lado, você tem que pensar os professores que aí estão ou que estão se formando, não tiveram em sua grade curricular a história da África.
Nós convidamos um sociólogo, montamos um projeto pequeno e apresentamos para o Estado. Começamos a trabalhar inicialmente com quatro diretorias de ensino e pensamos, primeiro, na questão da sensibilização dos professores. Isso porque em nosso país temos dificuldade de falar na questão do preconceito, num país que é totalmente miscigenado. Eles tiveram uma resistência, mas depois conversamos e mostramos que dentro da sala de aula existem situações de discriminação.
.NCC - E qual a importância da implementação dessa lei?
.Elisa - As situações de discriminação já estão naturalizadas e as pessoas, às vezes, não percebem e não querem admitir que têm essa prática. É o que estamos trabalhando no Conselho da Comunidade Negra e a Lei 10639 tem um aspecto muito importante que é fazer essa reflexão dentro da escola. As pessoas olham os negros como descendentes de escravos e não entendem que fomos escravizados, que não nascemos escravos. Assim, a lei traz essa vantagem de mudar o olhar que se tem para com a população negra. Faz ver que temos influência, que contribuímos e que é preciso a inclusão, trazendo uma reflexão sobre o que é ser negro. Ser negro é só gostar de samba, pagode, cerveja, futebol e usar trancinha, ou temos outras referências?
Foi feito um censo sobre o funcionalismo público no estado de São Paulo, e aí vemos aonde estão os negros dentro do funcionalismo, qual é o grau de instrução, qual o seu tempo de serviço e o cargo que ocupam. Normalmente a população negra está nos serviços subalternos. Não que isso diminua as pessoas, mas vemos que a população negra está na base. Mesmo que as pessoas tenham curso superior, pós graduação, mestrado, doutorado, poucas estão nos cargos de comando. Então tem alguma coisa errada aí no meio.
Isso também é uma reflexão que a Lei 10639 traz, porque o professor começa lá na base a formação dessas crianças. Elas começam a se informar, a se apropriar da questão racial, como é formado esse Brasil, e percebem a grande exclusão.
.NCC - Como está o andamento do projeto de capacitação de professores?
.Elisa - Num primeiro momento conseguimos que a Secretaria de Educação abraçasse o projeto de formação dos professores e, até 2006, nós tivemos quase 16 mil professores que hoje são multiplicadores. Começa agora uma formação para professores de história e geografia, mas essa lei tem que abranger todas as áreas, até para entender o que é esse mercado de trabalho que ainda olha a pessoa pelo tom da pele, o que é essa nossa segurança pública que na abordagem da população negra é mais truculenta.
Notas explicativas
Lei 10639 – altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Aprovada em 2003, propõe a inclusão da temática "História e Cultura Afro-Brasileira" no currículo escolar da Rede de Ensino.
Diretorias de ensino - executa a política educacional da Secretaria de Estado da Educação e coordena as Unidades Escolares da região que atua, acompanhando o desenvolvimento do ensino. Em São Paulo existem 91 Diretorias de Ensino.
Saiba mais sobre a atuação do Conselho da Comunidade Negra.
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