sábado, 7 de dezembro de 2013

O pai Aristóteles, o filho Nicômaco e a reintegração de posse dentro e fora do rio
José Luiz Adeve (Cometa)

Um pão pulmman descansa sobre a mesa,
uma fatia sem as bordas
em meio aos farelos do pão francês
deixado por alguém que o aquecera
numa torradeira, sanduicheira
comprada nas Casas Bahia
5 vezes, sem juros.

Em meio ao movimento silencioso
contraventor da madrugada na localidade
que se adentra e aos poucos e é diluído pela manhã,
num ponto da borda leste da cidade, Nicômaco,
segurança de banco e o pai Aristóteles, pedreiro,
vivem uma espécie de “se vira nos trinta” :
precisam sair da casa em função
da reintegração de posse.

Na casa ao lado com telhado coberto por um plástico
com a logo de uma repetidora da Globo de São José dos Campos,
uma mulher apanha do marido em meio a destruição de um micro-ondas Brastemp.
Para  Nicômaco e o pai Aristóteles resta não chamar a polícia tão temida pelas atitudes de ontem,
e falta pouco para se mudarem e, essa tensão, não só mora ao lado,
mas em muitos lados, tantos lados e para eles já faz parte do dia a dia da cidade...
Hoje, segundo a informação transmitida pelo rádio da marca CCE,
é o prazo final para desocupar, ou seja, para finalizar a reintegração de posse.

Aristóteles e o filho mais velho Nicômaco já providenciaram
a ida do restante da família para a casa do Tio Sólon
E quase tudo já está na residência do parente.

Chegou a hora, marcada no velho Citizen que Aristóteles ganhou na rifa,
o pai e o filho se entreolham, imagem sonorizada pelos gemidos de dor da vizinha
mais o choro das crianças com fraldas Pampers obtidas na permuta por faxina na farmácia.
Aristóteles passa a última lambusada de margarina delícia no pão e oferece à gata Ana Maria Braga
que infelizmente não se mudará com eles. 
Ouve - se ao longe vindo de uma TV marca AOC um áudio: 
“chegou a hora”.  

Aristóteles e Nicômaco partem da casa que já foi barraco, quase um barco no Tietê,
da terra que pertence ao Departamento de Águas, assim ouviram falar, estava no documento.
Deixam a mesa e duas cadeiras, recolhem as migalhas e se despedem da casa com emoção,
Numa espécie de reconhecimento por toda a batalha e a certeza que o mais importante
é sempre o que foi esquecido, uma constante dos povos nômades, da humanidade.

Hoje Aristóteles e Nicômaco não trabalham,
conseguiram dispensa para acertar as coisas,
no trem com ar condicionado da CPTM vivem,
inconscientemente um pouco da utopia
de uma sociedade sem classes,
pois o ar condicionado
um equipamento
que Aristóteles
instala tão bem,
geralmente
da Bosh,
e que
nunca
desfruta,
no vagão com vendedores de água Lindoya,
com as abruptas abordagens dos “nóias” e camelôs,
o ar condicionado é um bem para todos,
vive-se então a consumocracia.

Estação Engenheiro Goulart.
Aristóteles e Nicômaco descem.
Neymar os saúda no outdoor da Claro.
Rumo à casa do Tio Sólon,
Ah, Nicômaco se comprometeu;
“vou levar o cupim”,
apesar do pai Aristóteles
sonhar com uma picanha da Friboi...

Seguem alguns espirros de Aristóteles,
Parece que a potência e ato do ar condicionado da CPTM
não provocou só prazer, a dor insiste, ela está viva:
sair do barraco de alvenaria onde viveu 20 anos com a família...

Persiste então a dor pela ingratidão do senhorio das terras e das águas,
Além da outra dor, a dor de ser esquecido por Deus.
Para Aristóteles e toda a sua família essa é a maior dor.
Sendo a justiça dos homens perversa,
Fica uma sensação de abandono:,
“é o mesmo Deus das águas, dos rios,
enfim de tudo que tem vida,
o do Departamento de Águas e Energia Elétrica”.
“Será que Deus se esquecera
de Aristóteles, Nicômaco e sua família?

A picanha está cara,
A carne é fraca,
O cupim do Extra aumentou,
O miolo de Acem é mais saboroso
ou optar por linguiça Seara ou Serasa?

Chegam à casa do Tio Sólon,
Mais tarde o “Amor à Vida” reúne a gente.
Aristóteles, Nicômaco e a família estão vivos,
A chave do Brasil na copa tem o patrocínio da Vivo,
todos dormiram ontem com o empate da Ponte Preta,
amanhã pedra, parede, segurança pra quem?
Ah, o tubo da vida em que estão mantidos
É Amanco ou Tigre...?
Chove, a casa de Tio Sólon é um sobrado,
Todos para cima,
Aristóteles do seu canto:
Subimos na vida!!!

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