sexta-feira, 27 de maio de 2011


Desenvolvimento Local e Comércio de Massa: adversários ou parceiros?



Há algum tempo atrás era muito comum em São Paulo as famílias se abastecerem nos pequenos armazéns existentes em seus próprios bairros, somente se deslocando ao centro da cidade para comprar um ou outro gênero mais difícil de encontrar no comércio local. Também era comum o uso das chamadas “cadernetas”, onde o comerciante anotava cada compra que era feita pelo cliente, que, ao final do mês, ou eventualmente num prazo mais longo, fazia o acerto do valor devido ao armazém. Era uma forma, sem dúvida, de financiamento informal utilizada pelo comerciante e se baseava na relação de confiança com o cliente, que, muitas vezes, era seu vizinho de rua. Por outro lado, como o comerciante e o cliente faziam parte da mesma comunidade, grande parte dos recursos financeiros de um e de outro circulavam dentro da própria economia local e continuamente ajudavam esses bairros a prosperar e gerar empregos.



Os tempos mudaram e muitos desses antigos armazéns sucumbiram em função concorrência dos supermercados e hipermercados, que investem fortemente em ações de marketing e competem com enorme vantagem sobre os pequenos comerciantes locais, em quantidade de produtos, preço e facilidades de pagamento. Além disso, com o crescimento da cidade, também a antiga relação de confiança entre o comerciante e o cliente mudou, sendo hoje substituída pelo uso de instrumentos do sistema financeiro tradicional (SERASA, SPC, cartões de crédito, etc.), para avaliar e fornecer crédito aos clientes. De alguma forma, o impacto dessas mudanças está refletido no resultado da sondagem sobre hábitos de consumo realizada na região do Jardim Lapenna e da União de Vila Nova, sinalizando que hoje faz parte do cotidiano dos moradores desses bairros se abastecerem nas redes de varejo existentes fora deles.



Um aspecto a ser destacado nesse processo de mudança é o impacto, potencialmente danoso, que as redes de varejo de massa podem trazer para a economia local, uma vez que trabalham predominantemente com produtos de fornecedores não locais e, ao contrário do que ocorre com pequenos comerciantes, transferem grande parte das receitas obtidas na região para fora dela. É um ciclo normalmente perverso para os empreendedores locais, que não conseguem competir com as grandes redes e acabam ficando à mercê da informalidade e da precariedade de condições para desenvolver seu negócio, agravando o processo de perda de clientes.



Ao compararmos algumas das características desses dois formatos de comércio, podemos fazer a seguinte reflexão:



O comércio local:

Tem foco na inovação, na criatividade, no atendimento de necessidades específicas do morador local, pois nem sempre poderá concorrer em preço.

Atinge um público alvo menor, porém mais fiel, já que esse público encontra o que deseja próximo ao seu local de moradia e conhece o comerciante.

Teoricamente tem menores gastos com logística e armazenamento, mas, em contrapartida, não tem poder de compra junto aos fornecedores.




O comércio de massa (hipermercados):

Tem foco no preço, na variedade de produtos e nas facilidades de crédito, mas tem dificuldade de trabalhar com atendimento personalizado.

Atinge um público alvo bem maior, porém infiel, que estará sempre buscando diferenciais de preço e facilidades de pagamento.

Gasta em logística e precisa de espaço para estoque, mas possui grande poder de compra junto aos fornecedores.



O importante, quando pensamos nos aspectos econômicos do desenvolvimento local, é tentar diminuir as grandes diferenças existentes entre o pequeno comerciante local e o comércio de massa, sem esquecer que este segundo veio para ficar. Será preciso encontrar formas que facilitem a convivência entre esses dois formatos, nos quais ambos possam obter os resultados esperados.



Existem diversos caminhos para isso, mas certamente todos eles passam por uma maior integração entre os pequenos empreendedores locais, que possibilite a eles conseguir reduzir custos e ampliar receitas. No universo das grandes redes varejistas, é comum ver empresas se fundirem, formarem consórcios ou estabelecerem parcerias para obter ganhos de escala e redução de custos. Já entre os pequenos empreendedores, é comum encontrar aqueles que, apesar de atuarem num mesmo segmento e na mesma localidade, desenvolvem seus negócios sem qualquer relação com os demais. Muitas vezes um não sabe o que o outro faz, ou, pior, sabe e se limita a estabelecer uma relação de estrita concorrência e não de cooperação mútua, que permitiria a ambos melhorar os resultados de seus negócios.



Ao observarmos o aspecto da colaboração mútua, do lado dos pequenos comerciantes é possível pensar, por exemplo, na formação de centrais de compras ou vendas coletivas (até mesmo por via internet), em ações de promoção em conjunto, no desenvolvimento de parcerias com fornecedores locais, para colocar em suas prateleiras produtos mais competitivos ou diferenciados, investir na personalização do atendimento aos clientes, para fidelizá-los; enfim, resgatar e renovar o princípio da “caderneta” citada no início do artigo, que se baseia na relação de confiança estabelecida entre o cliente e o fornecedor, para que ambos possam obter aquilo que desejam.



Por outro lado, essa colaboração mútua também pode representar um passo importante para os pequenos fornecedores locais de bens e serviços, ajudando-os a obter maior competitividade e alcançar outros mercados de fora da região, ou até mesmo se tornarem uma nova opção de fornecimento para as próprias redes varejistas, fazendo com que essas redes, ao invés de adversárias, se tornem parceiras da comunidade e possam contribuir cada vez mais para o desenvolvimento local.



Gabriel Ligabue


Mai/2011


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