Fonte: Folha de São Paulo
Caderno Equilíbrio
Publicado em 06/03/2012
Educar para a Sustentabilidade
por Maria Alice Setubal
Minha mãe costumava dizer que os "filhos são nossa
obra-prima". Já meu pai, mais pragmático, falava sempre que
"difícil, na vida, é educar os filhos; a gente dá um jeito no
resto". Como fazer da difícil tarefa de educar os filhos uma
obra-prima?
A globalização, o acesso às informações em tempo real e a
velocidade das mudanças nos deixam atônitos e paralisados,
sem respostas assertivas para orientar nossa conduta em
relação aos filhos.
O padrão de sociedade que construímos está na raiz de
questões com as quais nós, pais e educadores, nos
deparamos. Uma sociedade na qual as relações são baseadas
em consumo e aparências, afetando o respeito ao outro na
sua diferença e a vida do planeta como um todo.
Em uma sociedade em que o consumo é o eixo em torno do
qual se desenvolvem toda a economia e os valores, o "ter" se
sobrepõe ao "ser" de forma avassaladora. É difícil trilhar um
caminho inverso.
Somos valorizados pelo que aparentamos ou temos, o que
torna vazias as formas de interação social.
Sem nos darmos conta, principalmente nas grandes cidades,
acabamos não tendo tempo para conhecer as pessoas, nem
mesmo aquelas à nossa volta. Não sabemos mais como
cultivar a convivência jogando conversa fora ou buscando
uma reflexão que nos tire do lugar-comum, do superficial
pasteurizado da comunicação de massas e das mídias sociais.
Na semana passada, em entrevista a uma revista semanal, a
escritora americana Rosalind Wiseman, especialista em
"bullying", destacou a dificuldade dos pais em impor limites
aos filhos. Ela afirma que, muitas vezes, os pais se colocam
como cúmplices dos filhos, não só defendendo-os de forma
incondicional, como também dando o mau exemplo em casa.
Como esperar que crianças e jovens sejam solidários e
abertos à diversidade cultural e social, se em casa somos
intolerantes, preconceituosos e autoritários? Como construir
relações sociais mais consistentes e verdadeiras, se
incentivamos de forma exagerada nossos filhos a usarem
grifes e, sobretudo, valorizamos amizades relacionadas a
prestígio e poder?
Vivemos um momento de transição para um paradigma em
que a sustentabilidade deve ser o eixo da nova sociedade. E
precisamos educar nossos filhos orientados por essa
concepção, pois esse será o mundo em que eles irão viver.
Um mundo onde a interdependência entre o ser humano e
seu entorno, assim como a inter-relação entre o local, o
regional e o global são premissas básicas.
Somos cidadãos planetários e por isso o "cuidado", ao lado
do diálogo, da diversidade cultural e da cooperação, passa a
ser um valor fundamental em todos os setores: economia,
cultura e educação. Precisamos aprender a cuidar de nós
mesmos, do outro e do ambiente em que vivemos. A
globalização e as novas tecnologias nos conectaram uns aos
outros e abriram novas formas de ser, pensar, sentir e agir.
Consumo responsável, alimentação saudável, respeito às
diversidades, saber ouvir e participar da vida social e política,
criatividade e inovação poderão ser os novos pilares da
sociedade contemporânea -e o Brasil tem todas as condições
para trilhar esse caminho.
Resta saber se teremos a maturidade e as condições para a
construção e a afirmação de novos valores. Papel esse que é
de toda a sociedade, mas, sobretudo, é responsabilidade dos
pais.
Pesquisas e a experiência de instituições e profissionais que
trabalham com jovens mostram que, para eles, a família é a
instituição de maior valor, o seu porto seguro. Sobretudo para
jovens de baixa renda, a mãe é a grande referência em suas
vidas.
Portanto, faço aqui um convite para refletirmos sobre que
educação queremos dar aos nossos filhos, para que vivam a
contemporaneidade que o século 21 nos impõe.
MARIA ALICE SETUBAL é doutora em psicologia da educação
(PUC-SP) e presidente dos Conselhos do Centro de Estudos e Pesquisas
em Educação, Cultura e Ação Comunitária, da Fundação Tide Setubal e do
Instituto Democracia e Sustentabilidade
terça-feira, 6 de março de 2012
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