segunda-feira, 17 de dezembro de 2012
Corinthians, o futebol e a capacidade de
recriarem multidões
José Luiz Adeve (Cometa)
Lá estavam eles cada qual com um dragão, São Jorge
os multiplicara, agora eram onze feras. Além da dádiva de um
Lancelot Tupiniquim no gol, ironia do destino da bola, do mito da criação
britânica, um verdadeiro cavaleiro da távola redonda, guardando a meta da nação
corinthiana. Talvez o mundo acabasse entre um Tite Tac e outro, ou então um
sheik provocasse, antes do fim, alguma de suas excentricidades. Mas quem
decidiria seria uma cabeça inca – hispânica de um Guerreiro, que espanou a já
espanada zaga do Chelsea.
O rei Arthur havia enterrado sua espada em algum canto do
estádio japonês. Caberia a um Torres Ibérico, antes do touché, o que não
aconteceu, desencravar a espada. Mas, um outro santo, além do
Jorge, São Francisco, Chicão para os profanos, contribuiu, sem
precisar de excessivos milagres, para a neutralização de qualquer
iniciativa de Fernando Torres de La Pelota.
Claro que a ausência do arquiteto Oscar no meio de campo dos ingleses,
contou bastante para a vitória dos gaviões transformados em dragões. Nós, fiéis
torcedores, agradecemos ironicamente, feito Barões de Mauá, a benevolência dos
ingleses com sua escalação estrategicamente equivocada.
Nosso samurai Jorge Henrique Yokohama com suas desdenhices
e provocações, insistências, assistências, treinado também nas filas dos
serviços públicos, deixou os ingleses intrigados com tamanha vontade de
sobreviver ao fim do mundo e de ser campeão desse mesmo mundo antes que acabe.
Valeu a persistência do carequinha Alessandro e o elevado
nível de letramento de Paulo André, para a conquista, enquanto que o tempo
passava Tite TAC, TITE TAC. Fábio Santos de La Izquierda com seus safanões
legais, “a regra é clara”, afastava qualquer perigo vinda da direita inglesa,
ou da terceira via, com a inócua e tardia mudança no meio de campo
britânico.
E claro que entre momentos de dragões e volantes, Ralph e
Paulinho se tornaram Cosme e Damião. Foram médicos, médiuns espirituais no meio
de campo, além de Danilo Rasputin com seus disfarces de não estar nem ai, mas
que com precisão e concentração oriental, apareceu no momento que a guarda da
rainha cochilou.
Cássio, além das defesas brilhantes, fazia coro com Tite
bradando: não vamos deixar os ingleses abastecerem seus aviões David Luiz em
nossas costas, como ocorreu durante a guerra das Malvinas, e que nenhum
“Zagueiro Police” nos aborde durante o jogo e drible os direitos humanos da
zaga, afinal temos passaporte e estamos no Japão, seguros, organizados com
capital humano e uma empresa chamada Corinthians, pessoa jurídica, e veja são
cerca de 20 mil torcedores, tudo preto e branco.
Aqui em terras brasileiras, na cidade de São Paulo, o
clima era de copa do mundo e de a qualquer momento a explosão viria, o grito de
gol, a necessidade de toda a Zona Leste de lavar a alma, a Zona Sul, Manos e
Minas, Centro, Zona Norte, o desejo era um só: Vai Corinthians.
E todos como um bando de loucos, percebemos naquela
cabeçada, que também exercemos uma relação táctil, o nosso rito, abraços,
toques, como um Quarup, demos vida eterna àquele gol, esse fenômeno que nasce e
morre a cada jogo, e que nos revela a presença dessa magia, liberdade,
brasilidade, etnias, solidariedade, e que esses 90 minutos podem ser também
utilizados para conectarmos tantos outros gols de cidadania e reflexão sobre o
mundo em que vivemos.
Valeu Corinthians, meus avós estão felizes, meus filhos
sorriem. Foi merecido e nós temos a certeza de que esse sentimento de nação
pode contagiar a todos, no sentido de tramarmos ótimas jogadas para um bem
viver de todos com um pouco dessa paixão. É o futebol nos reúne.
Vai Corinthians, Vai Brasil, Vai América do Sul, Vai
África... Todo poderoso Timão, caminho, jogada, habilidade,
solidariedade e como disse um dia Gilberto Freyre: “Não se pode separar
o futebol (association) de sua origem britânica para o considerar invenção
brasileira ou afro-brasileira. O que ele é, na sua atual e triunfante expressão
brasileira, é um jogo anglo-afro-brasileiro. Transculturação num dos seus
melhores exemplos.”.
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