
sábado, 2 de julho de 2016

A cidade fala
Aprendizados com o
Seminário Internacional
“Cidades e
Territórios: encontros e fronteiras na busca da equidade”
Sou cidade e não simplesmente urbana,
sou mais que o aspecto urbano,
sou como um animal em movimento.
Somente minha densidade
não me caracteriza como um habitar urbano.
Em minhas entranhas e bordas
sou também composta por pessoas sem poder e,
com justiça social, estou certa
de que essas pessoas
podem constituir minha economia.
Sinto, apesar de invadida e desurbanizada
pelo capital imobiliário especulativo e empresarial,
que os “sem – poderes” podem fazer parte da minha
história.
Desde o meu nascimento
a expectativa de meus geradores,
mesmo que subjetivamente,
é que me tornasse uma forma sensível de
civilização,
mas receio que os citadinos – gestores
perderam a capacidade de entender
o que a minha complexidade tem a falar.
A lei de minha terra urbana é muito ambígua
e existem corpos invisíveis dentro do meu organismo
dotado de sistemas complexos,
sendo que as imaterialidades e invisibilidades
de minhas bordas revelam a privatização cruel da
terra urbana.
Aos poucos meus espaços,
verdadeiros sujeitos urbanos,
são invadidos pela lógica do extrair, lucrar.
Cortam-me por estradas
para beneficiar interesses
de um determinado capital industrial,
investem em construções a comprometer
infraestruturas preexistentes,
sendo que minhas áreas
nas quais vivem os mais afetados pela desigualdade
permanecem a viver situações anômalas.
Na multidimensão da poética de meu espaço,
nos fios de meu tecido urbano, nos “nós” da
gentrificação,
vejo com muita esperança as minhas periferias
a produzirem mais do que resistência diante da
iniquidade,
a produzirem conhecimento.
Oh cronotópica dor de minhas heterotopias
segregadas,
território e dualidade rico – pobre tão desigual.
E nas subjetividades produzidas pelas crianças,
adolescentes, jovens e adultos
mais suas capacidades digitais,
nos seus micros – espaços em torno das escolas,
nas praças em tantos cantos, becos,
na minha alma coexiste uma autoria
que em muito ultrapassa a covardia:
vocação solidária e a luta, a luta é pedagógica.
Falam dentro do meu ser sobre gestão urbana,
territórios educadores, porém não retroalimentam
como deveriam
as inovações tecnológicas mobilizadoras com
potencial empreendedor,
como os FABLABS, por exemplo, para contribuir
com a descentralização de que necessito,
mais a perspectiva de uma economia criativa.
Além disso, sinto que meus ambientes naturais são
desvalorizados.
Minha gestão cultural ainda deixa a desejar
no fomento da produção cultural dos territórios
periféricos.
Por mais que pensem na minha organicidade
sempre relacionam a minha economia
à uma dinâmica global, e assim,
diante da escassez de instrumentos
para desenvolvimento local,
insistem em uma única variável econômica
como produção de valor: o mercado imobiliário.
Adensaram minhas conexões econômicas
que avançaram mais do que a própria produção
e esqueceram da “economia do conhecimento”
gerada também por plataformas digitais,
que em muito colaborariam
para a redução das desigualdades em busca da
equidade.
Sim, quero me integrar e me conectar às outras
cidades,
ambicionar processos competitivos elevados,
não relegar planos de inovação,
fundir as juventudes maker e da quebrada
a ocupar espaços de influência,
e assim responder a pergunta:
para que sou relevante?
Em meio a tanta complexidade,
ainda não tenho estrutura de metrópole,
necessito ter um formato de governo com governança
local,
ao longo de 30 anos sinto a redução da exclusão,
mas é latente a concentração da inclusão.
Apesar de minhas heterotopias e de avanço
democrático dos direitos sociais,
minha topografia social não recria novos polos
econômicos,
provocando desigualdades em um mesmo território.
E quando a escola é convocada para viver, em
conjunto,
processos de construção de nossa sociedade,
na revelação das metamorfoses entre educação,
território e espaço urbano, necessito de estratégias
para que as pessoas vivenciem processos,
descobertas e consequentemente compreendam
a relação do atitudinal político e a pobreza
extrema,
para que haja entendimento das causas da pobreza,
para que me conheçam e que todos se reconheçam.
Assim nasce a percepção de como sou constituída,
do que sinto, a escuta coletiva para minha voz
e que cada um é uma partícula de minha vida,
sendo que em cada território emerge
uma epistemologia para uma partilha do sensível
e de uma inteligência coletiva para a redução das
desigualdades,
num caminho para a equidade.
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