Em 1997, estive, durante uma semana, na hoje Fundação Casa com uma equipe de produção audiovisual. Filmamos naquela oportunidade dentre outras coisas, a pedido do governo do estado, as condições de habitabilidade e a dinâmica da aplicação das medidas sócio educativas. Percebemos que 60% dos jovens internados nas UAP - Unidades de Acolhimento Provisório vinham do interior do estado e muitos deles ali estavam por motivos fúteis como roubar galinhas, cavalo, roupa, briga de rua ou por decisões da justiça como medida protetiva diante do desiquilíbrio do meio familiar.
Estávamos no Complexo Imigrantes, que um ano depois foi desativado. O ECA na época completava 07 anos, avançávamos, porém as decisões e critérios para internação seguiam o senso comum sobre a criminalidade e uma certa resistência ao ECA.
Pois bem, estamos em 2010. O ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente – faz 20 anos, e ainda não foi totalmente compreendido e segundo a atual presidente da Fundação Casa, Berenice Gianella - “não há consideração nas decisões do judiciário sobre os direitos essenciais estabelecidos pelo ECA”.
Como cidadão, educador e profissional da comunicação, trabalho há 10 anos com crianças e adolescentes, e percebo que o aumento do número de adolescentes reclusos aumenta substancialmente a cada ano. A Defensoria Pública, por exemplo, pouco participa na defesa dessas crianças e adolescentes, os prazos de internação são extensos, as audiências excessivamente rápidas e sem testemunhas de defesa e, muitas vezes, insuficiência de provas de condenação são as principais violações apontadas por recente estudo do Ministério da Justiça.
As decisões de baixa fundamentação legal, que fazem com que crianças e adolescentes, muitas vezes, fiquem três anos reclusos, demonstram a necessidade de um debate amplo e ajustes na legislação.
Duas décadas de ECA e seus principais pontos como diminuição da mortalidade infantil, aumento do acesso à educação, redução do trabalho infantil, aumento das políticas municipais para os jovens, combate à gravidez na adolescência, aumento de programas para reduzir crimes entre jovens precisam realmente fazer parte de um filme real, que reconheça a necessidade de despontecializar o senso comum de uma sociedade amedrontada, e dar uma outra resposta à espetacularização midiática e banalização dos julgamentos de crianças e adolescentes.
Ressignificar o ECA nas esferas do executivo, legislativo e judiciário é preciso, além de ações sócio – comunicacionais que provoquem reflexões críticas contra o clamor do que aprendemos a denominar como deliquência juvenil.
José Luiz Adeve (Cometa)
Coordenador NCC – São Miguel no Ar
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