segunda-feira, 17 de janeiro de 2011
Universidade ao alcance de todos
Patrícia Junqueira é professora e doutora em educação. Atualmente é coordenadora do ciclo básico da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo – EACH-USP- Em entrevista ao NCC, Patrícia fala sobre as ações realizadas para garantir facilidade ao acesso às universidades públicas, como por exemplo o curso Pro Universidade, parceria EACH-USP e Fundação Tide Setubal e alerta sobre a falta de informação perante o processo de ingresso à universidade pública. E contrapõe essas questões com a realidade dos jovens da periferia, onde estudar dificilmente está em primeiro plano devido à necessidade de ajudar a família financeiramente.
NCC: Na sua opinião quais as ações que contribuem ou contribuiriam para o acesso à universidade pública de estudantes de escolas públicas?
Patrícia Junqueira: De início, penso que é necessário haver uma maior divulgação sobre as formas de acesso às universidades na região Leste. O que percebemos é que muitos jovens desconhecem a possibilidade e o fato de que há uma universidade pública na região.
Outra ação necessária é a sensibilização para a importância da continuidade dos estudos. Em razão das condições históricas e sociais da maioria da população brasileira, vimos que muitos jovens não se reconhecem em condições de cursar uma universidade, deixando de investir na possibilidade de continuarem estudando.
Além disso, certamente, está a importância da melhoria da qualidade da educação básica pública. Muitos alunos chegam ao ensino médio com grande defasagem idade / série, desestimulando a permanência na escola. A pressão para que ingressem precocemente no mercado de trabalho também é um complicador para a continuidade dos estudos da população menos favorecida economicamente.
Gostaria de frisar que são esses, exatamente, os pontos que o Programa de Incentivo ao Avanço da Escolarização, parceria entre a EACH-USP e a Fundação Tide Setubal, estão abordando no desenvolvimento do projeto do cursinho Pró-Universidade.
NCC: Qual o principal motivo de um percentual tão pequeno de alunos vindos de escolas públicas nas Universidades Públicas?
Patrícia Junqueira: Os fatores acima mencionados estão entre as principais razões. Mas reitero que a falta de informação e descrença nas próprias condições para ingresso são fortes obstáculos para que esse número não seja maior.
Temos visto que muitos alunos desconhecem que a universidade pública não cobra mensalidades, nem tem taxas de matrícula ou material.
Desconhecem que é possível solicitar isenção na taxa de inscrição para a Fuvest (vestibular que dá acesso à USP).
Desconhecem que há programas de incentivo à permanência dos estudantes, com modalidades de bolsas de estudo que permitem que os alunos possam cobrir seus custos durante o período de graduação.
Desconhecem, também, que a USP tem ações afirmativas que favorecem o acesso à universidade de alunos oriundos de escolas públicas, como o INCLUSP.
Superestimam a dificuldade de vencer a concorrência no vestibular. A USP tem uma imagem de cursos extremamente concorridos, com notas de corte altíssimas. Mas, em verdade, há uma parcela significativa de carreiras na universidade cujas notas de corte e proporção candidatos / vaga é bastante baixa.
É preciso dizer, ainda, que a EACH é a unidade da USP com maior percentual de alunos oriundos de escolas públicas. Fato que se deve, também, pela presença geográfica do campus, localizado na Zona Leste, que facilita o deslocamento de moradores da região até a universidade.
NCC: Qual a importância do Cursinho Pró - Universitário realizado pela EACH - USP para os alunos dessa região da cidade, na qual se verificam índices de qualidade de ensino relativamente baixos?
Patrícia Junqueira:A EACH foi idealizada com o forte compromisso de voltar-se para a realidade das comunidades da região Leste de São Paulo. Está em nosso projeto pedagógico o objetivo de estabelecer parcerias que promovam o desenvolvimento local, em seus diferentes âmbitos.
Dentro desse princípio maior, as atividades do cursinho objetivam potencializar as condições dos alunos das escolas públicas para ingressarem na universidade, bem como desmistificar os estereótipos (acima mencionados) que são, muitas vezes, os principais entraves para que esses alunos cheguem à universidade.
NCC: Qual o principal fator que levou à criação da EACH - USP? (ou há uma série de fatores?)
Patrícia Junqueira:Há uma série de fatores, mas poderia destacar que a efetivação do projeto aconteceu em decorrência da convergência do compromisso da USP na ampliação de vagas, notadamente tendo em vista a facilitação do acesso a outras camadas da população (sobretudo da Zona Leste) e a mobilização política dos movimentos por educação nessa região, que há tempos reivindicavam a presença de uma universidade pública.
NCC: Qual o percentual de alunos da Zona Leste que estudam na EACH - USP?
Patrícia Junqueira:Esse percentual, desde o início das atividades da EACH, em 2005, sempre foi maior do que em qualquer das outras unidades da USP. No ano de 2010, temos 162 alunos ingressantes com essas características. (no link a seguir, é possível encontrar mais detalhes sobre essa questão: http://each.uspnet.usp.br/each/noticia.php?id=938)
NCC: Quais os cursos oferecidos pela EACH - USP e existe um motivo específico para essa oferta?
Patrícia Junqueira: A EACH oferece, atualmente, dez cursos de graduação: Ciências da Atividade Física, Gerontologia, Obstetrícia, Têxtil e Moda, Sistemas de Informação, Licenciatura em Ciências da Natureza, Gestão Ambiental, Gestão de Políticas Públicas, Lazer e Turismo e Marketing.
Os dez cursos foram criados a partir da constatação das mudanças históricas e sociais que impactam na produção do conhecimento e nas áreas de atuação profissional, que passam a exigir competências e habilidades distintas dos tradicionais campos de conhecimento. Significa dizer que são áreas “híbridas”, uma vez que a contemporaneidade exige novos desafios na construção do conhecimento, avançando para além das fronteiras mais conhecidas. Em todos os nossos cursos, os alunos se veem confrontados com questões atuais, de caráter social e abrangente, desde seu primeiro ano de formação. A partir do Ciclo Básico, que compõem o quadro de disciplinas comuns a todos os alunos ingressantes, busca-se romper o isolamento do conhecimento compartimentalizado, destacando a complexidade dos fenômenos e a necessidade de que os novos profissionais saibam transitar entre diferentes campos do conhecimento, tendo bases teóricas distintas para compor uma formação mais crítica e comprometida com as questões que afligem as sociedades contemporâneas.
Desse modo, além de permitir uma formação mais abrangente e flexível, nossos alunos desenvolvem forte compromisso com o valor da diversidade, seja ela de pensamento, de postura e de diálogo com a diversidade humana.
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